Nossas vidas se resumem a bolas de neve. São assim: tornam-se cada vez maiores conforme se movem. Cada qual com sua formação, embora redondas o bastante para se deslocarem. Neve de água, chocolate ou cerveja: isso é o que menos importa. O que importa é o que é encontrado no meio do caminho. No meio do caminho pode haver uma pedra, um buraco ou um palhaço. Estão os cacos de vidro e as penas de ganso. O que encontramos é conseqüência do caminho que escolhemos: não costumamos ver flores em campos de batalha nem dinamites em jardins.
Somos bolas de neve acostumadas com obstáculos e em todos eles parte de nós é desgastada. Vivemos lutando para alcançar as mais altas posições e, muitas vezes, nossa força não é grande o bastante para subirmos e inclui-se a isso a força da gravidade, que nos obriga a estar acima apenas do chão e torna as descidas impiedosas desilusões. Bolas de neve são fracas, sensíveis... Desmancham-se, derretem-se, basta uma queda, uma pressão maior ou uma pedra muito grande no caminho. Elas não são transparentes: ninguém consegue ter certeza do que existe dentro de uma bola de neve. Sua clareza externa não indica nada, apesar de supormos que ela também seja assim por dentro: bolas de neve sofrem preconceitos. Até seu nome é um pré-conceito, já que muitas vezes nem bolas elas são. Há aquelas quadradas a ponto de não se mexerem, ovais a ponto de apenas bambearem ou, as piores, aquelas ocas, que aparentam ser bolas, mas não passam de meros círculos.
Bolas de neve são fantásticas: são o aprimoramento do gelo. Perderam o aspecto rígido, a postura reta, a transparência. Feitas de água, chocolate ou cerveja: isso não as define como melhores ou piores. É tão relativo quanto as próprias bebidas: imagine-se tomando um copo de chocolate quente em um deserto, numa situação de sede intensa.
Somos como bolas de neve: acumuladores. Dependemos dos caminhos, das circunstâncias, das subidas e descidas. Há tantas folhas secas grudadas em nós, no lugar de flores. Há tantos cacos de vidro no lugar de isopores para amortecer. O motivo é essa nossa incapacidade de deixar os problemas para trás, de agarrarmos mais ao que realmente nos importa, ao que realmente é parte de nós. É essa a maior diferença em relação às bolas de neve: nós somos capazes de fazer escolhas, as mais variadas que sejam. Podemos escolher os desvios, as facilidades, o esconderijo. Podemos optar pelo que realmente nos convém, pela nossa real essência. No entanto preferimos, tantas vezes, ser apenas as supracitadas bolas de neve. Apenas nos acomodamos e deixamos que problemas se acumulem na mesma proporção que vitórias. E passamos a confiar nos caminhos que percorreremos, no clima e nas subidas pavorosas, passando a ser constantes os penhascos e derretimentos.
É preciso que acumulemos valores, amores e flores. E deixemos os horrores e as dores. Caso contrário, transformar-nos-emos em seres subordinados a tudo, menos a nós mesmos.
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ousadia. como você pode falar com essa desenvoltura sobre o mais complexo dos assuntos ? achei muita ousadia, mas gostei. a comparação com a bola de neve foi uma coincidência não foi ? só pode ser, ou eu teria que te admirar além da conta. e isso é desgastante, a admiração. você é uma bola de neve de cerveja. e sabe ? minha bola de neve tem flores, mas acabo me orgulhando também das dores. acho que sou uma boa parte dores, e se não fosse assim, seria uma bola bem menor do que sou hoje, provavelmente uma bola de neve medíocre. e eu gosto de ser uma bola de neve gorda, me orgulho de ser pouco medíocre. as flores me fazem boba, mas também me orgulho de ter sensibilidade. eu me orgulho de você ser a bola de neve que é. tem um formato bonito ..
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